Entrevista com Mark Millar
MARVEL: Outros escritores britânicos, como Warren Ellis e Garth Ennis, não foram criados com os heróis Marvel clássicos e por isso não têm grande estima por eles. Você, por outro lado, parece ser um Zumbi Marvel. Como isso aconteceu?
MARK: Sempre me perguntei como isso aconteceu e só posso atribuir ao fato de ser o mais novo de seis filhos. Tenho quatro irmãos mais velhos, dois deles gostavam bastante de quadrinhos, e então quando todos os caras da minha idade estavam lendo 2000AD, o gibi britânico estiloso da época, eu estava pegando edições de Amazing Spider-Man. Além disso, eu não tinha dinheiro algum, então tinha que ler o que meus irmãos compravam. Eles eram muito chegados na Marvel dos anos 60, e quando eu apareci na década de 70, não iam mudar seus hábitos de leitura por causa de um pestinha de cabelos encaracolados. Então tive que me adaptar para sobreviver, pegar o que eles traziam para casa. Na época, a Marvel UK republicava muita coisa e cresci lendo versões em preto-e-branco e em formato maior das séries norte-americanas que vocês tinham lido alguns anos antes. Fiz vários dos meus colegas de colégio lerem, e era um ambiente perfeito, toda uma turma que sabia a identidade secreta do Homem-Gigante e outras coisas obscuras. Lembro que a gente brincou de super-herói todos os recreios por uns dois anos, sempre discutindo quem tinha sido melhor. Tinha um garoto bem quieto na turma, Gerard Molloy, que sempre fazia o Vigia. Ele ficava em uma parte mais alta vendo a gente brigar. Sério. Quase sempre.
MARVEL: Você lia os quadrinhos Beano na Escócia? Existem quadrinhos ou personagens escoceses que você gostava?
MARK: Sim, eu gostava bastante da Beano, da Dandy, da Beezer e de quase todos esses quadrinhos dos quais os norte-americanos nunca ouviram falar. A maioria tinha histórias de uma página, geralmente cômicas, embora algumas aventuras tivessem a impressionante duração de quatro páginas. Eu gostava de Billy’s Boots, a história um jovem jogador de futebol que só fazia gols quando usava as chuteiras assombradas de um homem que morreu em 1920. Também gostava de Wizzer and Chips – a estrela era um garoto que levava uma serpente de cinco metros para assistir aula do seu lado (e ninguém notava). Mas a nata era Oor Wullie and The Broons. Esta era a única história feita exclusivamente na Escócia, e as coletâneas vendiam um milhão de exemplares no Natal. Nada mal se você considerar que somos um paisinho de seis milhões de habitantes. Era um gibi para cada casa.
MARVEL: Como foi sua infância, em relação aos quadrinhos? Quais foram os momentos marcantes, que agora você percebe como os que o puseram neste caminho para ser o que é hoje?
MARK: A Escócia é provavelmente o país mais pobre da Europa Ocidental e eu cresci numa das áreas mais pobres da região mais pobre. Falando desse jeito, parece meio violento ou duro, porque não parecia assim na época e acho que fui criado com algumas bênçãos, considerando que eu tinha essas coisas de nerd como quadrinhos e adesivos e cartas e assim por diante. Minha sorte foi que todas as crianças que conheci também gostavam disso, pelo menos na escola primária, e como eu sabia desenhar sempre pediam para eu fazer o Dr. Destino enfrentando Shang Chi ou coisa do tipo. Era um planeta nerd, acho, embora todos os caras ali soubessem fazer ligação direta num carro. Quanto a um momento definidor, provavelmente foi quando percebi que não era que nem os outros homens, quando me pegaram usando uma fantasia de Homem-Aranha por baixo do uniforme do colégio. Era uma daquelas roupas mal-licenciadas pela Marvel, com o peito amarelo, as pernas vermelhas e dizia Homem-Aranha em letras bem grandes na frente. Mas uma fantasia era uma fantasia e, aos oito anos de idade, coloquei por baixo do uniforme para me divertir ao máximo e fiquei envergonhado, quase desmaiei em aula quando a professora abriu minha camisa e revelou minha identidade secreta para todos. Meu velho amigo Tommy Lally, com quem ainda bebo toda sexta à noite, adora contar essa história para os amigos. Não entendo como consegui sair com garotas.
MARVEL: Você tem fama de se auto-promover sem pudores. Como se sente com essa reputação? Merecida ou negativa?
MARK: Merecida, espero. Stan Lee se auto-promovia sem pudores, e não há melhor homem na Terra que Stan Lee.
MARVEL: Quais são seus “melhores momentos” se auto-promovendo? A aposta de Superman [N. do T.: Millar apostou US$ 1 mil que Jim Caviezel, o astro de A Paixão de Cristo, seria o próximo Superman do cinema] é um dos memoráveis, certo?
MARK: Um bom mágico nunca revela seus truques, como dizem.
MARVEL: Como você conheceu sua esposa? Qual é a visão dela do mercado de quadrinhos e da sua parte nele?
MARK: Comecei a sair com Gill na universidade, pouco antes de trancar matrícula e tentar carreira como escritor. Ela ainda estava na escola, mas madura o suficiente para perceber que eu era um idiota e para não se viciar nesses panfletinhos coloridos. Me dá um calafrio lembrar que todas as outras garotas com quem saí foram forçadas a ler Cavaleiro das Trevas, Watchmen, a Guerra Kree-Skrull etc. etc. Mas a Gill sempre era bem direta em dizer que essa era a razão por que todos meus outros relacionamentos não haviam passado dos dois meses. Eu até gosto do fato de ela não ler gibis porque posso relaxar quando desço do meu escritório no sótão. Para ela, “Lee, Kirby e Ditko” pode ser um escritório de advogados judeus. Ela mantém meus pés no chão e, já que não lê minhas séries nem meu site, é quase como se eu tivesse uma identidade secreta. Mas ela lê meus cheques. É uma grande fã dos cheques.
OS SUPREMOS
MARVEL: Mais do que qualquer outra série Ultimate até então, Os Supremos teve essa coisa divertida de retornar personagens Marvel ao zero e reconstruí-los de uma nova forma. Você sente alguma coisa, por mínima que seja, quando recebe a incumbência de desconstruir estes heróis?
MARK: Acho que procrastinação demais não é uma boa idéia quando você está trabalhando numa mídia pop. Escritores de quadrinhos trabalham muito rápido e, ao contrário de filmes e romances, a história pode sair poucos meses depois de surgir na sua cabeça. A comparação mais próxima é com os escritores de pulps dos anos 30, que tinham que confiar nos instintos e esperar o melhor. Os Supremos é um daqueles projetos em que tudo se encaixou. Os personagens eram ótimos, a equipe criativa sincronizou e eu consegui fazer algo que estava borbulhando na minha cabeça desde que eu tinha 13 anos e li as primeiras HQs de super-herói de Alan Moore. A idéia de super-heróis no mundo real sempre me excitou e era minha vez de dar meu toque no conceito. Além disso, não posso enfatizar o quanto Bryan Hitch foi essencial. Sem a arte dele, esta série seria nada. Ele é o melhor do mercado e ver ele ilustrando sua história é como ter Spielberg dirigindo seu roteiro. Graças a Deus ele é muito feio, senão eu teria muita inveja de todo aquele talento dentro de um corpo bonito.
MARVEL: Quando a Marvel Comics nasceu, era uma idéia nova ter heróis imperfeitos, cujas imperfeições seriam tão interessantes para as histórias quanto seus superpoderes. Mas os personagens eram sempre motivados pelo heroísmo. Supremos certamente amplia estas imperfeições e falhas a um nível bem superior às versões originais. Você percebe como a sociedade mudou desde aqueles tempos, talvez mais inocentes, e como seu senso do que é considerado heróico talvez também tenha mudado?
MARK: Acho que não. As falhas certamente mudaram, porque refletem o mundo moderno, mas heroísmo é um conceito simples que mudou muito pouco desde a aurora da humanidade. A idéia de heroísmo é fazer algo que ajude outras pessoas mesmo se você correr algum risco. Isso funciona tão bem nos Supremos quanto na mitologia grega. As imperfeições são interessantes, sim, e concordo que talvez tenhamos levado-as ao limite nos Supremos, mas não acho que tenhamos prejudicado os personagens com isso. Tony sempre bebeu, Hank tinha um histórico de violência doméstica, Banner sempre foi tomado pela auto-comiseração. Apenas aplicamos uma técnica narrativa moderna, mas na essência são os mesmos personagens.
MARVEL: Nick Fury se parece muito com o ator Samuel L. Jackson. Considerando que isso seja intencional, por que fazer referência a ele em particular?
MARK: Bom, ele é o rei do “cool”, não é? Vem da idéia de ver o que esses personagens têm de mais básico e descobrir como eles funcionam. Amo Nick Fury mais do que qualquer pessoa. Ele é um dos meus personagens Marvel prediletos, mas o “cool” que Steranko embutiu no personagem era dos anos 60. É claro que isso ainda é legal no sentido retrô, clássico, mas significa pouco para um garoto atual. Além disso, Nick Fury parece um nome daqueles filmes blaxpoitation dos anos 70. Soa como um herói de discoteca negro, ou algo assim, e queríamos brincar com isso.
Sabe que Sam é um grande fã dos Vingadores? A gente não sabia quando o escolhemos, mas é uma boa dose de coincidência ele estar liderandos os Vingadores agora. Ele comprou várias páginas originais de Hitchy.
MARVEL: Um personagem que não mudou muito foi o Capitão América. O Steve Rogers de Supremos tem praticamente o mesmo tom do Steve Rogers original. Sempre se quis isso para o personagem? Ou foi algo que você decidiu após testar outros conceitos?
MARK: A pior noção do Universo Ultimate é de que estamos tentando fazer história estilo “O Que Aconteceria Se”, ou versões alternativas, porque é exatamente o oposto. Quando começamos, o consenso era que os personagens do Universo Marvel tradicional haviam distanciado-se demais de suas personalidades originais. Tínhamos que lembrar as pessoas por que elas gostavam deles. Isso queria dizer levar o Aranha de volta para a escola, aos problemas com garotas, na série de Brian. Para mim, o Capitão América tinha que virar um homem deslocado no tempo, um homem com muitas certezas para um mundo complexo. Tudo que fizemos foi respeitar os personagens.
MARVEL: Seu Hulk Ultimate é fora desse mundo. Tão sutil quanto sua caracterização do Capitão América, seu Hulk tem tanto energia frenética que parece querer saltar da página. Você fez dele um canibal! Ele come gente! Você teve que brigar para manter estas, digamos, nuances? Ninguém da Marvel disse “mmm... talvez o Hulk não devesse comer seus colegas?”
MARK: Acho que eles teriam se metido se não fizesse sentido, mas voltando às raízes Jekyll & Hyde do Hulk, sentimos que seria importante ter o id monstruoso de Banner ser seu oposto total. Como Hulk, ele podia fazer tudo que secretamente desejava, fosse ter Betty de volta, bater em quem lhe colocava para baixo ou, como vegetariano, engolir toda carne que pudesse pegar com suas grandes mãos.
MARVEL: Betty Ross é totalmente diferente da sua caracterização inicial. Nos primeiros anos de Lee/Kirby, ela era desenhada como uma tímida garota que andava pela base militar do papai, desmaiava, chorava e soluçava. A sua Betty Ross... bom, ela não é esse tipo de garota! A relação dela com Bruce é bem diferente. Em comparação, você acha que ela é uma boa pessoa, uma má pessoa ou nem se importa com o que pensam dela?
MARK: A caracterização original de Betty não fazia sentido para mim. Ela não é o tipo de pessoa que se sentiriar atraída por um cara como Bruce. Pelo que entendo, homens e mulheres com a personalidade de Bruce atraem valentões e pessoas que tomam as decisões por elas. É falta de amor próprio, pois acham que é aquilo que merecem, mas também completa o casal porque são duas personalidades extremas criando uma pessoa completa. É por isso que fiz Betty ser amiga de Jan, porque ela é uma versão feminina de Bruce. Ela não gosta muito de si mesmo e está em uma relação abusiva (com Hank Pym). Quanto a amigos, faz sentido para mim ela procurar amigas como Betty na universidade, para se sentir diminuída.
A habilidade de tornar-se menor é um superpoder estranho. As mulheres Marvel parecem ter alguns problemas, pois a outra garota proeminente na editora é uma que fica invisível. Mas estou fugindo do assunto... Não, não acho que Betty seja má pessoa. Ela só não é alguém com quem eu gostaria de andar.
MARVEL: Supremos Vol. 1 acabou na edição 13, mas você e Bryan Hitch voltaram com o Volume 2 dez meses depois. Vocês estão sem limites neste volume, matando personagens significativos, transformando eles em traidores e detonando o status quo em geral; também é a última passagem de vocês pelos Supremos. Há alguma sensação de liberdade por saber que é sua saída da série?
MARK: Bom, Bryan e eu acertamos que não faríamos Supremos 2 se não conseguíssemos superar o original, então mandamos tudo às favas. Mas você está certo, há uma liberdade em saber que você pode fazer a festa e outra pessoa vai ter que limpar o salão.
MARVEL: E o que vocês acham de entregar as chaves para Jeph Loeb e Joe Madureira, em particular?
MARK: Sinceramente? Não podíamos estar mais satisfeitos. Jeph é um escritor brilhante e é provavelmente o melhor produtor (porque é isso que ele é) comercial de quadrinhos na ativa. Ele consegue fazer ouro, e o único ponto negativo é que o porco provavelmente vai duplicar as vendas do nosso ponto mais alto. E sabe o que mais? Ele nem vai suar para isso. Ele e Joe têm um estilo bem diferente do nosso, e isso é bom. Eu odiaria ver alguém tentando nos copiar.
MARVEL: Foi muito legal você ficar provocando para descobrirmos se Thor é real ou apenas maluco, e parece que agora temos uma resposta, ou algo próximo. Mas ele não seria um personagem melhor com essa dose de mistério? Não é melhor a gente ficar sabendo pouco sobre ele?
MARK: É importante manter um certo mistério quando o personagem veio, no caso, da mitologia, mas a piada já estava indo muito longe. Se não déssemos uma resposta definitiva sobre a origem de Thor após 5 anos e vinte-e-seis ediçõs, acho que os leitores nos atacariam com furadeiras. Eu vi a quinta temporada de Arquivo X. Eu sei o que é insatisfação.
MARVEL: Falando nisso, e os poderes dele? Tecnologia ou...?
MARK: Leia o gibi.
MARVEL: Alguns adversários estratégicos dos EUA reagiram com uma Iniciativa de Defesa Super-Humana própria, numa história ironicamente chamada “Eixo do Mal”. Mas com Nick Fury, a gente pode ver o ponto de vista deles. Os Supremos têm ficado cada vez mais agressivos no exterior, então é natural que se sintam ameaçados. Quando você escreveu esta história, você deixou essa ambigüidade para a gente não saber mesmo para quem torcer?
MARK: Certamente. Eu sou um liberal, tenho orgulho de ser liberal e tenho reputação de liberal na indústria. Mas, para me forçar, escrevi de propósito essa série tanto para soldados quanto para ativistas pela paz. Ele não toma partido. O Capitão, Thor, Homem de Ferro e os outros têm sua própria voz. O Gavião Arqueiro é um neoconservador de carteirinha, mas ainda assim é simpático. Acho que uma das razões para a série funcionar é o fato de a gente levantar a câmera e deixar que os personagens falem. Há liberais que estão sempre me dizendo que amam a série pela ousadia, mas – na mesma sessão de autógrafos – tem um soldado do exército que me mostra uma tatuagem do Capitão Ultimate, e um amigo meu tem uma foto dele lendo a primeira coletânea na cama do Saddam Hussein. Acho isso muito interessante e, como escritor, sinto que fiz o trabalho direito.
MARVEL: Este volume é uma crítica a fatos do mundo real?
MARK: Eu não planejei fazer alegorias. As idéias vêm das nossas experiências e eu tenho mais interesse em ler política do que fantasia, então minhas histórias se valem mais da CNN do que de Tolkien. Somos a soma de tudo que absorvemos pelos olhos e acho que o fato de eu ter interesse no mundo real me ajuda a dar um sabor diferente às histórias, que muita gente gosta.
MARVEL: E o que há no futuro para o Universo Ultimate?
MARK: Não muito. Eu lancei os X-Men Ultimate, Supremos e ajudei a lançar o Quarteto Fantástico, então não tenho muito mais a dizer. Dito isso, tenho uma certa queda – uma paixão que vem desde os meus sete anos – por Blade e o Motoqueiro Fantasma. Talvez eu proponha séries deles hoje. Adoro trabalhar com Ralph, John e Nicole, então seria ótimo fazer mais com eles. Aliás, acho que você me inspirou. Vou ligar pra eles mais tarde.
QUARTETO FANTÁSTICO ULTIMATE
MARVEL: Antes de deixarmos o Universo Ultimate, algumas perguntas sobre o Quarteto Fantástico, por favor. Um dos temas recorrentes da série é a dúvida sobre o Quarteto ser de super-heróis ou cientistas. Como você os vê?
MARK: Super-heróis, sem dúvida. Sempre acho que quem descreve eles como cientistas ou exploradores está apenas com vergonha de ler gibi de super-herói. Sir Ranulph Fiennes é um explorador. Stephen Hawking é um cientista. Reed Richards usa um uniforme azul, tem um codinome e luta contra um homem chamado Dr. Destino. Ele é um super-herói, mas também um cientista no mesmo sentido que o Homem-Aranha é um super-herói que também é professor de colegial e fotógrafo.
MARVEL: Você teve essa idéia de Reed “esticar” seu cérebro quando começou a série, ou foi algo que surgiu quando você voltou?
MARK: Stan Lee me deu o melhor conselho de todos quando assumi a série. Ele disse que a série se chamava Quarteto FANTÁSTICO, e não Quarteto REALISTA, e que não havia idéia maluca demais. A diversão está em inventar essas coisas de improviso.
MARVEL: Como lhe veio a idéia de um cross-over com a versão zumbi do Universo Marvel? E se pensou mesmo em um cross-over com o Universo Marvel normal, ou foi só uma provocação?
MARK: O cross-over é algo com que a gente brinca em todos os encontros de escritores e editores. Tem caras que amam a idéia, outros que odeiam. Achei que ia ser legal a provocação, já que parece um tabu pra muita gente. Mas, do meu ponto de vista, não vejo motivo. Venderia muito, mas eu gosto da simplicidade do universo Ultimate. Quanto aos zumbis, a idéia veio depois do brilhante filme do Danny Boyle, Extermínio. A melhor idéia dele foi ter zumbis que correm, ao invés de vagar, e comecei a pensar como seria assustador se eles pudessem passar por baixo de portas, derrubar paredes e tal. Escrevi a idéia no avião para os EUA e depois de dez minutos de tiração de sarro, o pessoal começou a ver como eu e pegar a idéia. A série derivada, Zumbis Marvel, é fantástica, alias. Se ainda não leu pegue a coletânea.
MARVEL: Alguma idéia do que está no futuro do Quarteto Zumbi?
MARK: Eles estão presos, então vai ter o momento em que eles vão escapar. Vai ser muito legal.
MARVEL: Namor é bem mais vilanesco na sua versão Ultimate. Há chance de ele vir para o outro lado, como sua contraparte, ou ele sempre será um vilão?
MARK: Não, acho melhor deixar ele lá como um anti-herói imprevisível. A versão de Bill Everett, até onde sei, foi o primeiro jovem revoltado na cultura pop norte-americana. Precedeu James Dean em uns quinze anos, acho, e gosto da sensação de perigo que ele trazia. Ele se acomodou muito no Universo Marvel, e hoje não parece mais ameaçador. Quero abordar isso na Guerra Civil porque ele é um ótimo personagem.
MARVEL: O Quarteto recentemente embarcou em uma viagem temporal para impedir o acidente que lhes deu poderes, o que teve alguns efeitos colaterais, como a transformação da história mundial. Este arco vai ter efeitos no resto da série?
MARK: Não, aquela história é auto-contida e dobra-se sobre si mesmo três vezes antes do fim. Não há pontas soltas para brincar, embora um mundo cheio de super-heróis fosse uma série derivada legal. Imagine toda pessoa, animal, todo inseto tendo super-poderes. Como Zumbis Marvel, criei a Super-Terra como algo que podia virar outra série. O Quarteto é divertido, e muito. Vou sentir tanta falta quanto dos Supremos e adoraria pegar a série original com Bryan Hitch ou Frank Quitely, ou talvez um cara tipo Ryan Sook (de quem sou grande fã). Tenho milhões de idéias para a série. Podia escrever ela por cinco anos, ou até todo mundo cansar.
MARK E A GUERRA CIVIL
MARVEL: A gente ouviu muitas hipóteses de fãs sobre o que seria a Guerra Civil, bem como várias declarações da Marvel. Mas você é o cara que está planejando a história, escrevendo os diálogos e armando a ação! Pode resumir em poucas palavras o que a Guerra Civil significa para você, quanto ao tema?
MARK: Guerra Civil é o que acontece quando os heróis Marvel são forçados a crescer. Simples assim. A população precisa e quer heróis. Eles não poderiam sobreviver sozinhos num mundo de super-vilões e invasões alienígenas. Porém, essa fantasia de velho oeste onde eles põem máscaras e podem lutar contra quem quiserem não fecha com o mundo moderno. Pessoas de verdade estão morrendo e, pela primeira vez, os heróis são convidados a vir para o lado da lei e da ordem em condição oficial, para que possam ser regulamentados. Alguns ficam felizes com isso e outros acham que compromete tudo que eles representam.
MARVEL: Como você acha que os leitores deveriam relacionar a Guerra Civil com o que está acontecendo no mundo real? São analogias diretas que você está fazendo, para fazer apelo a uma opinião política em particular?
MARK: Acho que é um erro dizer que a série faz uma analogia do mundo real. Funciona bem se for uma obra singular como A Revolução dos Bichos, de Orwell, mas pode cansar se a Marvel basear seu plano de longo prazo nela. Como disse antes, me inspiro no que acontece à minha volta, mais do que em gibis velhos ou séries de TV. Escrevo o que acho relevante para o mundo em que eu vivo e é por isso, acho, que a série tem boa aceitação com o grande público.
MARVEL: Como você equilibra a influência do mundo real e o desejo de fazer uma história duradoura (que não pareça datada daqui a 10 ou 20 anos)?
MARK: Olha, eu QUERO que essa série pareça datada daqui a 10 ou 20 anos. Quero que ela fique datada em CINCO anos. O negócio com os quadrinhos é que eles são uma mídia pop e é um erro as pessoas quererem pensar em posteridade. Somos um meio descartável, no sentido de que muitos leitores não guardam nosso trabalho, apenas acabam de ler e saem atrás de outro estímulo pop. Um bom gibi, para mim, captura perfeitamente o período em que foi criado. Cavaleiro das Trevas e Watchmen são provavelmente os melhores gibis da história, e têm raízes profundas na Guerra Fria e no governo Reagan. Um bom gibi é uma cápsula do tempo de 22 páginas, seja o Quarteto Fantástico falando dos Beatles ou super-caras na era Bush preocupados com sua liberdade civil.
MARVEL: Falamos antes de como você é um “geek Marvel total”. Você realmente ama os personagens e o universo “de gibi” que eles habitam. O que significa para você pessoalmente ser o responsável pelo projeto que vai definir o futuro de todo esse mundo de personagens?
MARK: Me dá tanta felicidade quanto medo. Não é falsa modéstia. Escrever um que seja destes personagens é uma grande responsabilidade porque você está encarregado das memórias de infância futuras de centenas de milhares de pessoas, talvez milhões. Eles são amados no mundo tudo, então escrever, por exemplo, o Homem-Aranha é uma tarefa enorme. É desolador, de verdade. Então imagine o peso da responsabilidade quando você está pensando TODOS os personagens Marvel da próxima geração. É muito legal e muito assustador. Meu medo é que eu tenha sido atropelado por um caminhão alguns anos atrás e que isso tudo seja uma alucinação, porque é EXATAMENTE o que eu queria fazer quando era pirralho. É assim que eu queria a minha vida, exatamente assim. Então gosto muito e tenho esse temor de que esteja deitado em algum lugar por aí, sendo alimentado por tubos.
MARVEL: Poderia acontecer todo tipo de “evento” após Vingadores: A Queda e Dinastia M. Na verdade, vários foram discutidos nos encontros de escritores e muitos ficaram de lado. Qual o apelo da Guerra Civil que a torna especial a ponto da Marvel topar? Tem algum apelo mais direto nela para você como escritor ou fã?
MARK: Para ser honesto, acabei de emprestar a idéia que tive para o evento do PRÓXIMO ano. Bryan Hitch e eu estamos trabalhando em um projeto confidencial bem relacionado a este. Ainda vai demorar para você ficar sabendo, mas foi só questão de destacar um aspecto do resto.
MARVEL: Falando nestas idéias deixadas de lado, pode dar uma pista do que elas consistiam?
MARK: Eu não lembro bem das outras idéias. Sei que havia uma que está sendo utilizada em outro lugar, então não posso falar. Sempre chego de ressaca nessas coisas e não consigo lembrar de nada dito antes da 1 da tarde. Você está perguntando pro cara errado.
MARVEL: Tem tanta coisa acontecendo no Universo Marvel agora que traz grandes mudanças: Vingadores: A Queda, Dinastia M, Guerra Secreta, Illuminati, a origem de Wolverine, até mesmo as idéias conspiracionais que você apresentou no Homem-Aranha. É difícil manter todas essas bolas no ar? Como escritor, você está ciente do que os outros caras estão fazendo?
MARK: Tenho que ficar ciente até certo nível e inclusive ler gibis que não leria normalmente. Dito isso, Tom Brevoort é essencial para este projeto, porque sem ele eu estaria morto na página cinco. Tom sabe cada detalhe do passado, presente e futuro da Marvel e me guiou por todo o caminho, oferecendo conselhos sábios e sugestões brilhantes. Não se engane com sua semelhança com o Primo It. Esse cara tem um cérebro afiadíssimo e a Guerra Civil seria uma porcalhada completa sem ele. O escritório de Tom é ótimo. Audy, Aubrey e Molly foram excelentes.
MARVEL: Aparentemente, na primeira edição de Guerra Civil você consegue acabar com um dos alvos da ira do seu chefe. Joe Quesada sempre teve contas a acertar com o super-garoto Speedball. Você teve algum prazer em transformá-lo em baixa de guerra? Como Joe reagiu ao receber o roteiro? Muitas congratulações?
MARK: Joe uma vez me confessou que não sabe ler. Ele perdeu umas semanas de aula quando tinha seis anos e acabou ficando para trás, sem recuperar. Ele reconhece as letras e os logotipos das empresas, e se vira assim no mundo moderno. Ele não tinha entendido a proposta até que Steve fez as figurinhas e ele pegou a idéia básica vendo quadro a quadro.
MARVEL: Guerra Civil, naturalmente, acontece dentro das fronteiras dos EUA, mas há espaço na história para mostrar a reação de outros países quanto ao que está acontecendo aqui? Certamente as nações fronteiriças, como o Canadá, serão afetadas, mas veremos ramificações para a Europa, Ásia e outras partes do mundo?
MARK: Não muito. Os outros países são chatos, não acha? Se falam sobre alguma coisa que aconteceu fora dos EUA no noticiário, eu faço de conta que não vi, e faço o mesmo nos gibis. E digo isso como alguém que mora em outro país. Vamos falar do Canadá em algum ponto, mas é o mais exótico que vamos chegar. Tem muita coisa interessante acontecendo nos EUA para a gente perder tempo fora.
MARVEL: Compartilhe com os fãs um pouco da diversão que você teve criando os roteiros. Há rumores de que você fez três ou quatro roteiros, cortando, tirando e editando sem piedade os argumentos ou personagens que não funcionam pra você. Como foi isso? É o seu processo normal?
MARK: Não, é uma ocasião única para mim. Faço isso há um certo tempo e sei me virar com um roteiro. É incomum fazer um segundo roteiro para uma edição de Supremos, por exemplo, e um terceiro nunca aconteceu. Então imagine minha surpresa quando as duas primeiras edições de Guerra Civil passaram por algo tipo seis ou oito esboços, e continuavam pedindo mudanças. Geralmente, quando falamos de “esboços”, são algumas páginas, mas dessa vez foi preciso mudar seqüências e direcionamentos inteiros, mudar personagens de lugar. Introduzimos, por exemplo, um grupo chamado HAMMER que substituiria a SHIELD no registro de heróis e escrevemos duas edições com os caras antes de nos cortarem. É muito trabalho e não estou reclamando, porque uma série dessas precisa ser feita direito e com aprovação absoluta de toda a editora. Estou pegando personagens emprestados de outras pessoas e é óbvio que eles têm que estar satisfeitos com o jeito como vou devolvê-los. Tem sido uma grande colaboração, pois ouvi muita gente sobre o que fazer. É bem menos autonomia do que estou acostumado.
MARVEL: Capitão América e Homem de Ferro, dois “irmãos” que serviram juntos desde o início dos Vingadores (eles até compartilhavam a série Tales of Suspense nos anos 60) são os principais personagens da Guerra Civil. A pergunta “de que lado você está?” está relacionada diretamente à posição de cada um deles. Pode explicar por que escolher estes dois personagens como pontos de referência da Guerra Civil?
MARK: Foi uma evolução natural. Não lembro onde começou, mas os lados foram discutidos exaustivamente com os principais escritores e editores numa de nossas reuniões. O Capitão era óbvio, porque ele é o cara da liberdade, e o Homem de Ferro parecia o único cara com autoridade para discordar dele. Se esse fosse um debate ideológico entre Capitão América e Tigra, por exemplo, não acho que os leitores e o país ficariam tão divididos.
MARVEL: Que personagens surpreenderam você ao ganhar espaço na série; aqueles que talvez você não achasse que gostaria de escrevê-los, ou que não tinham muito a dizer, mas acabaram ganhando papéis mais importantes?
MARK: Esse seria o melhor jeito de fugir da pergunta, mas na verdade gostei de escrever todos eles. Foi um trabalho duro, mas o legal de fazer um cross-over gigante como esse é que você pode escolher entre dúzias de personagens clássicos para a próxima cena. É uma alegria total porque é impossível ficar entediado. Sempre que escrevo Reed ou Sue lembro de quanto gosto deles, mas o Capitão e Tony foram provavelmente os mais divertidos. O segredo é respeitar todos. É por isso que não vou matar todo mundo. O personagem mais imbecil, com a pior equipe criativa, uma origem terrível e que apareceu só um punhado de vezes é o personagem favorito de alguém. Alguém se vestiu como ele no Halloween, sabe? Você tem que ter isso em mente.
Fonte: Miolos.
MARVEL: Outros escritores britânicos, como Warren Ellis e Garth Ennis, não foram criados com os heróis Marvel clássicos e por isso não têm grande estima por eles. Você, por outro lado, parece ser um Zumbi Marvel. Como isso aconteceu?
MARK: Sempre me perguntei como isso aconteceu e só posso atribuir ao fato de ser o mais novo de seis filhos. Tenho quatro irmãos mais velhos, dois deles gostavam bastante de quadrinhos, e então quando todos os caras da minha idade estavam lendo 2000AD, o gibi britânico estiloso da época, eu estava pegando edições de Amazing Spider-Man. Além disso, eu não tinha dinheiro algum, então tinha que ler o que meus irmãos compravam. Eles eram muito chegados na Marvel dos anos 60, e quando eu apareci na década de 70, não iam mudar seus hábitos de leitura por causa de um pestinha de cabelos encaracolados. Então tive que me adaptar para sobreviver, pegar o que eles traziam para casa. Na época, a Marvel UK republicava muita coisa e cresci lendo versões em preto-e-branco e em formato maior das séries norte-americanas que vocês tinham lido alguns anos antes. Fiz vários dos meus colegas de colégio lerem, e era um ambiente perfeito, toda uma turma que sabia a identidade secreta do Homem-Gigante e outras coisas obscuras. Lembro que a gente brincou de super-herói todos os recreios por uns dois anos, sempre discutindo quem tinha sido melhor. Tinha um garoto bem quieto na turma, Gerard Molloy, que sempre fazia o Vigia. Ele ficava em uma parte mais alta vendo a gente brigar. Sério. Quase sempre.
MARVEL: Você lia os quadrinhos Beano na Escócia? Existem quadrinhos ou personagens escoceses que você gostava?
MARK: Sim, eu gostava bastante da Beano, da Dandy, da Beezer e de quase todos esses quadrinhos dos quais os norte-americanos nunca ouviram falar. A maioria tinha histórias de uma página, geralmente cômicas, embora algumas aventuras tivessem a impressionante duração de quatro páginas. Eu gostava de Billy’s Boots, a história um jovem jogador de futebol que só fazia gols quando usava as chuteiras assombradas de um homem que morreu em 1920. Também gostava de Wizzer and Chips – a estrela era um garoto que levava uma serpente de cinco metros para assistir aula do seu lado (e ninguém notava). Mas a nata era Oor Wullie and The Broons. Esta era a única história feita exclusivamente na Escócia, e as coletâneas vendiam um milhão de exemplares no Natal. Nada mal se você considerar que somos um paisinho de seis milhões de habitantes. Era um gibi para cada casa.
MARVEL: Como foi sua infância, em relação aos quadrinhos? Quais foram os momentos marcantes, que agora você percebe como os que o puseram neste caminho para ser o que é hoje?
MARK: A Escócia é provavelmente o país mais pobre da Europa Ocidental e eu cresci numa das áreas mais pobres da região mais pobre. Falando desse jeito, parece meio violento ou duro, porque não parecia assim na época e acho que fui criado com algumas bênçãos, considerando que eu tinha essas coisas de nerd como quadrinhos e adesivos e cartas e assim por diante. Minha sorte foi que todas as crianças que conheci também gostavam disso, pelo menos na escola primária, e como eu sabia desenhar sempre pediam para eu fazer o Dr. Destino enfrentando Shang Chi ou coisa do tipo. Era um planeta nerd, acho, embora todos os caras ali soubessem fazer ligação direta num carro. Quanto a um momento definidor, provavelmente foi quando percebi que não era que nem os outros homens, quando me pegaram usando uma fantasia de Homem-Aranha por baixo do uniforme do colégio. Era uma daquelas roupas mal-licenciadas pela Marvel, com o peito amarelo, as pernas vermelhas e dizia Homem-Aranha em letras bem grandes na frente. Mas uma fantasia era uma fantasia e, aos oito anos de idade, coloquei por baixo do uniforme para me divertir ao máximo e fiquei envergonhado, quase desmaiei em aula quando a professora abriu minha camisa e revelou minha identidade secreta para todos. Meu velho amigo Tommy Lally, com quem ainda bebo toda sexta à noite, adora contar essa história para os amigos. Não entendo como consegui sair com garotas.
MARVEL: Você tem fama de se auto-promover sem pudores. Como se sente com essa reputação? Merecida ou negativa?
MARK: Merecida, espero. Stan Lee se auto-promovia sem pudores, e não há melhor homem na Terra que Stan Lee.
MARVEL: Quais são seus “melhores momentos” se auto-promovendo? A aposta de Superman [N. do T.: Millar apostou US$ 1 mil que Jim Caviezel, o astro de A Paixão de Cristo, seria o próximo Superman do cinema] é um dos memoráveis, certo?
MARK: Um bom mágico nunca revela seus truques, como dizem.
MARVEL: Como você conheceu sua esposa? Qual é a visão dela do mercado de quadrinhos e da sua parte nele?
MARK: Comecei a sair com Gill na universidade, pouco antes de trancar matrícula e tentar carreira como escritor. Ela ainda estava na escola, mas madura o suficiente para perceber que eu era um idiota e para não se viciar nesses panfletinhos coloridos. Me dá um calafrio lembrar que todas as outras garotas com quem saí foram forçadas a ler Cavaleiro das Trevas, Watchmen, a Guerra Kree-Skrull etc. etc. Mas a Gill sempre era bem direta em dizer que essa era a razão por que todos meus outros relacionamentos não haviam passado dos dois meses. Eu até gosto do fato de ela não ler gibis porque posso relaxar quando desço do meu escritório no sótão. Para ela, “Lee, Kirby e Ditko” pode ser um escritório de advogados judeus. Ela mantém meus pés no chão e, já que não lê minhas séries nem meu site, é quase como se eu tivesse uma identidade secreta. Mas ela lê meus cheques. É uma grande fã dos cheques.
OS SUPREMOS
MARVEL: Mais do que qualquer outra série Ultimate até então, Os Supremos teve essa coisa divertida de retornar personagens Marvel ao zero e reconstruí-los de uma nova forma. Você sente alguma coisa, por mínima que seja, quando recebe a incumbência de desconstruir estes heróis?
MARK: Acho que procrastinação demais não é uma boa idéia quando você está trabalhando numa mídia pop. Escritores de quadrinhos trabalham muito rápido e, ao contrário de filmes e romances, a história pode sair poucos meses depois de surgir na sua cabeça. A comparação mais próxima é com os escritores de pulps dos anos 30, que tinham que confiar nos instintos e esperar o melhor. Os Supremos é um daqueles projetos em que tudo se encaixou. Os personagens eram ótimos, a equipe criativa sincronizou e eu consegui fazer algo que estava borbulhando na minha cabeça desde que eu tinha 13 anos e li as primeiras HQs de super-herói de Alan Moore. A idéia de super-heróis no mundo real sempre me excitou e era minha vez de dar meu toque no conceito. Além disso, não posso enfatizar o quanto Bryan Hitch foi essencial. Sem a arte dele, esta série seria nada. Ele é o melhor do mercado e ver ele ilustrando sua história é como ter Spielberg dirigindo seu roteiro. Graças a Deus ele é muito feio, senão eu teria muita inveja de todo aquele talento dentro de um corpo bonito.
MARVEL: Quando a Marvel Comics nasceu, era uma idéia nova ter heróis imperfeitos, cujas imperfeições seriam tão interessantes para as histórias quanto seus superpoderes. Mas os personagens eram sempre motivados pelo heroísmo. Supremos certamente amplia estas imperfeições e falhas a um nível bem superior às versões originais. Você percebe como a sociedade mudou desde aqueles tempos, talvez mais inocentes, e como seu senso do que é considerado heróico talvez também tenha mudado?
MARK: Acho que não. As falhas certamente mudaram, porque refletem o mundo moderno, mas heroísmo é um conceito simples que mudou muito pouco desde a aurora da humanidade. A idéia de heroísmo é fazer algo que ajude outras pessoas mesmo se você correr algum risco. Isso funciona tão bem nos Supremos quanto na mitologia grega. As imperfeições são interessantes, sim, e concordo que talvez tenhamos levado-as ao limite nos Supremos, mas não acho que tenhamos prejudicado os personagens com isso. Tony sempre bebeu, Hank tinha um histórico de violência doméstica, Banner sempre foi tomado pela auto-comiseração. Apenas aplicamos uma técnica narrativa moderna, mas na essência são os mesmos personagens.
MARVEL: Nick Fury se parece muito com o ator Samuel L. Jackson. Considerando que isso seja intencional, por que fazer referência a ele em particular?
MARK: Bom, ele é o rei do “cool”, não é? Vem da idéia de ver o que esses personagens têm de mais básico e descobrir como eles funcionam. Amo Nick Fury mais do que qualquer pessoa. Ele é um dos meus personagens Marvel prediletos, mas o “cool” que Steranko embutiu no personagem era dos anos 60. É claro que isso ainda é legal no sentido retrô, clássico, mas significa pouco para um garoto atual. Além disso, Nick Fury parece um nome daqueles filmes blaxpoitation dos anos 70. Soa como um herói de discoteca negro, ou algo assim, e queríamos brincar com isso.
Sabe que Sam é um grande fã dos Vingadores? A gente não sabia quando o escolhemos, mas é uma boa dose de coincidência ele estar liderandos os Vingadores agora. Ele comprou várias páginas originais de Hitchy.
MARVEL: Um personagem que não mudou muito foi o Capitão América. O Steve Rogers de Supremos tem praticamente o mesmo tom do Steve Rogers original. Sempre se quis isso para o personagem? Ou foi algo que você decidiu após testar outros conceitos?
MARK: A pior noção do Universo Ultimate é de que estamos tentando fazer história estilo “O Que Aconteceria Se”, ou versões alternativas, porque é exatamente o oposto. Quando começamos, o consenso era que os personagens do Universo Marvel tradicional haviam distanciado-se demais de suas personalidades originais. Tínhamos que lembrar as pessoas por que elas gostavam deles. Isso queria dizer levar o Aranha de volta para a escola, aos problemas com garotas, na série de Brian. Para mim, o Capitão América tinha que virar um homem deslocado no tempo, um homem com muitas certezas para um mundo complexo. Tudo que fizemos foi respeitar os personagens.
MARVEL: Seu Hulk Ultimate é fora desse mundo. Tão sutil quanto sua caracterização do Capitão América, seu Hulk tem tanto energia frenética que parece querer saltar da página. Você fez dele um canibal! Ele come gente! Você teve que brigar para manter estas, digamos, nuances? Ninguém da Marvel disse “mmm... talvez o Hulk não devesse comer seus colegas?”
MARK: Acho que eles teriam se metido se não fizesse sentido, mas voltando às raízes Jekyll & Hyde do Hulk, sentimos que seria importante ter o id monstruoso de Banner ser seu oposto total. Como Hulk, ele podia fazer tudo que secretamente desejava, fosse ter Betty de volta, bater em quem lhe colocava para baixo ou, como vegetariano, engolir toda carne que pudesse pegar com suas grandes mãos.
MARVEL: Betty Ross é totalmente diferente da sua caracterização inicial. Nos primeiros anos de Lee/Kirby, ela era desenhada como uma tímida garota que andava pela base militar do papai, desmaiava, chorava e soluçava. A sua Betty Ross... bom, ela não é esse tipo de garota! A relação dela com Bruce é bem diferente. Em comparação, você acha que ela é uma boa pessoa, uma má pessoa ou nem se importa com o que pensam dela?
MARK: A caracterização original de Betty não fazia sentido para mim. Ela não é o tipo de pessoa que se sentiriar atraída por um cara como Bruce. Pelo que entendo, homens e mulheres com a personalidade de Bruce atraem valentões e pessoas que tomam as decisões por elas. É falta de amor próprio, pois acham que é aquilo que merecem, mas também completa o casal porque são duas personalidades extremas criando uma pessoa completa. É por isso que fiz Betty ser amiga de Jan, porque ela é uma versão feminina de Bruce. Ela não gosta muito de si mesmo e está em uma relação abusiva (com Hank Pym). Quanto a amigos, faz sentido para mim ela procurar amigas como Betty na universidade, para se sentir diminuída.
A habilidade de tornar-se menor é um superpoder estranho. As mulheres Marvel parecem ter alguns problemas, pois a outra garota proeminente na editora é uma que fica invisível. Mas estou fugindo do assunto... Não, não acho que Betty seja má pessoa. Ela só não é alguém com quem eu gostaria de andar.
MARVEL: Supremos Vol. 1 acabou na edição 13, mas você e Bryan Hitch voltaram com o Volume 2 dez meses depois. Vocês estão sem limites neste volume, matando personagens significativos, transformando eles em traidores e detonando o status quo em geral; também é a última passagem de vocês pelos Supremos. Há alguma sensação de liberdade por saber que é sua saída da série?
MARK: Bom, Bryan e eu acertamos que não faríamos Supremos 2 se não conseguíssemos superar o original, então mandamos tudo às favas. Mas você está certo, há uma liberdade em saber que você pode fazer a festa e outra pessoa vai ter que limpar o salão.
MARVEL: E o que vocês acham de entregar as chaves para Jeph Loeb e Joe Madureira, em particular?
MARK: Sinceramente? Não podíamos estar mais satisfeitos. Jeph é um escritor brilhante e é provavelmente o melhor produtor (porque é isso que ele é) comercial de quadrinhos na ativa. Ele consegue fazer ouro, e o único ponto negativo é que o porco provavelmente vai duplicar as vendas do nosso ponto mais alto. E sabe o que mais? Ele nem vai suar para isso. Ele e Joe têm um estilo bem diferente do nosso, e isso é bom. Eu odiaria ver alguém tentando nos copiar.
MARVEL: Foi muito legal você ficar provocando para descobrirmos se Thor é real ou apenas maluco, e parece que agora temos uma resposta, ou algo próximo. Mas ele não seria um personagem melhor com essa dose de mistério? Não é melhor a gente ficar sabendo pouco sobre ele?
MARK: É importante manter um certo mistério quando o personagem veio, no caso, da mitologia, mas a piada já estava indo muito longe. Se não déssemos uma resposta definitiva sobre a origem de Thor após 5 anos e vinte-e-seis ediçõs, acho que os leitores nos atacariam com furadeiras. Eu vi a quinta temporada de Arquivo X. Eu sei o que é insatisfação.
MARVEL: Falando nisso, e os poderes dele? Tecnologia ou...?
MARK: Leia o gibi.
MARVEL: Alguns adversários estratégicos dos EUA reagiram com uma Iniciativa de Defesa Super-Humana própria, numa história ironicamente chamada “Eixo do Mal”. Mas com Nick Fury, a gente pode ver o ponto de vista deles. Os Supremos têm ficado cada vez mais agressivos no exterior, então é natural que se sintam ameaçados. Quando você escreveu esta história, você deixou essa ambigüidade para a gente não saber mesmo para quem torcer?
MARK: Certamente. Eu sou um liberal, tenho orgulho de ser liberal e tenho reputação de liberal na indústria. Mas, para me forçar, escrevi de propósito essa série tanto para soldados quanto para ativistas pela paz. Ele não toma partido. O Capitão, Thor, Homem de Ferro e os outros têm sua própria voz. O Gavião Arqueiro é um neoconservador de carteirinha, mas ainda assim é simpático. Acho que uma das razões para a série funcionar é o fato de a gente levantar a câmera e deixar que os personagens falem. Há liberais que estão sempre me dizendo que amam a série pela ousadia, mas – na mesma sessão de autógrafos – tem um soldado do exército que me mostra uma tatuagem do Capitão Ultimate, e um amigo meu tem uma foto dele lendo a primeira coletânea na cama do Saddam Hussein. Acho isso muito interessante e, como escritor, sinto que fiz o trabalho direito.
MARVEL: Este volume é uma crítica a fatos do mundo real?
MARK: Eu não planejei fazer alegorias. As idéias vêm das nossas experiências e eu tenho mais interesse em ler política do que fantasia, então minhas histórias se valem mais da CNN do que de Tolkien. Somos a soma de tudo que absorvemos pelos olhos e acho que o fato de eu ter interesse no mundo real me ajuda a dar um sabor diferente às histórias, que muita gente gosta.
MARVEL: E o que há no futuro para o Universo Ultimate?
MARK: Não muito. Eu lancei os X-Men Ultimate, Supremos e ajudei a lançar o Quarteto Fantástico, então não tenho muito mais a dizer. Dito isso, tenho uma certa queda – uma paixão que vem desde os meus sete anos – por Blade e o Motoqueiro Fantasma. Talvez eu proponha séries deles hoje. Adoro trabalhar com Ralph, John e Nicole, então seria ótimo fazer mais com eles. Aliás, acho que você me inspirou. Vou ligar pra eles mais tarde.
QUARTETO FANTÁSTICO ULTIMATE
MARVEL: Antes de deixarmos o Universo Ultimate, algumas perguntas sobre o Quarteto Fantástico, por favor. Um dos temas recorrentes da série é a dúvida sobre o Quarteto ser de super-heróis ou cientistas. Como você os vê?
MARK: Super-heróis, sem dúvida. Sempre acho que quem descreve eles como cientistas ou exploradores está apenas com vergonha de ler gibi de super-herói. Sir Ranulph Fiennes é um explorador. Stephen Hawking é um cientista. Reed Richards usa um uniforme azul, tem um codinome e luta contra um homem chamado Dr. Destino. Ele é um super-herói, mas também um cientista no mesmo sentido que o Homem-Aranha é um super-herói que também é professor de colegial e fotógrafo.
MARVEL: Você teve essa idéia de Reed “esticar” seu cérebro quando começou a série, ou foi algo que surgiu quando você voltou?
MARK: Stan Lee me deu o melhor conselho de todos quando assumi a série. Ele disse que a série se chamava Quarteto FANTÁSTICO, e não Quarteto REALISTA, e que não havia idéia maluca demais. A diversão está em inventar essas coisas de improviso.
MARVEL: Como lhe veio a idéia de um cross-over com a versão zumbi do Universo Marvel? E se pensou mesmo em um cross-over com o Universo Marvel normal, ou foi só uma provocação?
MARK: O cross-over é algo com que a gente brinca em todos os encontros de escritores e editores. Tem caras que amam a idéia, outros que odeiam. Achei que ia ser legal a provocação, já que parece um tabu pra muita gente. Mas, do meu ponto de vista, não vejo motivo. Venderia muito, mas eu gosto da simplicidade do universo Ultimate. Quanto aos zumbis, a idéia veio depois do brilhante filme do Danny Boyle, Extermínio. A melhor idéia dele foi ter zumbis que correm, ao invés de vagar, e comecei a pensar como seria assustador se eles pudessem passar por baixo de portas, derrubar paredes e tal. Escrevi a idéia no avião para os EUA e depois de dez minutos de tiração de sarro, o pessoal começou a ver como eu e pegar a idéia. A série derivada, Zumbis Marvel, é fantástica, alias. Se ainda não leu pegue a coletânea.
MARVEL: Alguma idéia do que está no futuro do Quarteto Zumbi?
MARK: Eles estão presos, então vai ter o momento em que eles vão escapar. Vai ser muito legal.
MARVEL: Namor é bem mais vilanesco na sua versão Ultimate. Há chance de ele vir para o outro lado, como sua contraparte, ou ele sempre será um vilão?
MARK: Não, acho melhor deixar ele lá como um anti-herói imprevisível. A versão de Bill Everett, até onde sei, foi o primeiro jovem revoltado na cultura pop norte-americana. Precedeu James Dean em uns quinze anos, acho, e gosto da sensação de perigo que ele trazia. Ele se acomodou muito no Universo Marvel, e hoje não parece mais ameaçador. Quero abordar isso na Guerra Civil porque ele é um ótimo personagem.
MARVEL: O Quarteto recentemente embarcou em uma viagem temporal para impedir o acidente que lhes deu poderes, o que teve alguns efeitos colaterais, como a transformação da história mundial. Este arco vai ter efeitos no resto da série?
MARK: Não, aquela história é auto-contida e dobra-se sobre si mesmo três vezes antes do fim. Não há pontas soltas para brincar, embora um mundo cheio de super-heróis fosse uma série derivada legal. Imagine toda pessoa, animal, todo inseto tendo super-poderes. Como Zumbis Marvel, criei a Super-Terra como algo que podia virar outra série. O Quarteto é divertido, e muito. Vou sentir tanta falta quanto dos Supremos e adoraria pegar a série original com Bryan Hitch ou Frank Quitely, ou talvez um cara tipo Ryan Sook (de quem sou grande fã). Tenho milhões de idéias para a série. Podia escrever ela por cinco anos, ou até todo mundo cansar.
MARK E A GUERRA CIVIL
MARVEL: A gente ouviu muitas hipóteses de fãs sobre o que seria a Guerra Civil, bem como várias declarações da Marvel. Mas você é o cara que está planejando a história, escrevendo os diálogos e armando a ação! Pode resumir em poucas palavras o que a Guerra Civil significa para você, quanto ao tema?
MARK: Guerra Civil é o que acontece quando os heróis Marvel são forçados a crescer. Simples assim. A população precisa e quer heróis. Eles não poderiam sobreviver sozinhos num mundo de super-vilões e invasões alienígenas. Porém, essa fantasia de velho oeste onde eles põem máscaras e podem lutar contra quem quiserem não fecha com o mundo moderno. Pessoas de verdade estão morrendo e, pela primeira vez, os heróis são convidados a vir para o lado da lei e da ordem em condição oficial, para que possam ser regulamentados. Alguns ficam felizes com isso e outros acham que compromete tudo que eles representam.
MARVEL: Como você acha que os leitores deveriam relacionar a Guerra Civil com o que está acontecendo no mundo real? São analogias diretas que você está fazendo, para fazer apelo a uma opinião política em particular?
MARK: Acho que é um erro dizer que a série faz uma analogia do mundo real. Funciona bem se for uma obra singular como A Revolução dos Bichos, de Orwell, mas pode cansar se a Marvel basear seu plano de longo prazo nela. Como disse antes, me inspiro no que acontece à minha volta, mais do que em gibis velhos ou séries de TV. Escrevo o que acho relevante para o mundo em que eu vivo e é por isso, acho, que a série tem boa aceitação com o grande público.
MARVEL: Como você equilibra a influência do mundo real e o desejo de fazer uma história duradoura (que não pareça datada daqui a 10 ou 20 anos)?
MARK: Olha, eu QUERO que essa série pareça datada daqui a 10 ou 20 anos. Quero que ela fique datada em CINCO anos. O negócio com os quadrinhos é que eles são uma mídia pop e é um erro as pessoas quererem pensar em posteridade. Somos um meio descartável, no sentido de que muitos leitores não guardam nosso trabalho, apenas acabam de ler e saem atrás de outro estímulo pop. Um bom gibi, para mim, captura perfeitamente o período em que foi criado. Cavaleiro das Trevas e Watchmen são provavelmente os melhores gibis da história, e têm raízes profundas na Guerra Fria e no governo Reagan. Um bom gibi é uma cápsula do tempo de 22 páginas, seja o Quarteto Fantástico falando dos Beatles ou super-caras na era Bush preocupados com sua liberdade civil.
MARVEL: Falamos antes de como você é um “geek Marvel total”. Você realmente ama os personagens e o universo “de gibi” que eles habitam. O que significa para você pessoalmente ser o responsável pelo projeto que vai definir o futuro de todo esse mundo de personagens?
MARK: Me dá tanta felicidade quanto medo. Não é falsa modéstia. Escrever um que seja destes personagens é uma grande responsabilidade porque você está encarregado das memórias de infância futuras de centenas de milhares de pessoas, talvez milhões. Eles são amados no mundo tudo, então escrever, por exemplo, o Homem-Aranha é uma tarefa enorme. É desolador, de verdade. Então imagine o peso da responsabilidade quando você está pensando TODOS os personagens Marvel da próxima geração. É muito legal e muito assustador. Meu medo é que eu tenha sido atropelado por um caminhão alguns anos atrás e que isso tudo seja uma alucinação, porque é EXATAMENTE o que eu queria fazer quando era pirralho. É assim que eu queria a minha vida, exatamente assim. Então gosto muito e tenho esse temor de que esteja deitado em algum lugar por aí, sendo alimentado por tubos.
MARVEL: Poderia acontecer todo tipo de “evento” após Vingadores: A Queda e Dinastia M. Na verdade, vários foram discutidos nos encontros de escritores e muitos ficaram de lado. Qual o apelo da Guerra Civil que a torna especial a ponto da Marvel topar? Tem algum apelo mais direto nela para você como escritor ou fã?
MARK: Para ser honesto, acabei de emprestar a idéia que tive para o evento do PRÓXIMO ano. Bryan Hitch e eu estamos trabalhando em um projeto confidencial bem relacionado a este. Ainda vai demorar para você ficar sabendo, mas foi só questão de destacar um aspecto do resto.
MARVEL: Falando nestas idéias deixadas de lado, pode dar uma pista do que elas consistiam?
MARK: Eu não lembro bem das outras idéias. Sei que havia uma que está sendo utilizada em outro lugar, então não posso falar. Sempre chego de ressaca nessas coisas e não consigo lembrar de nada dito antes da 1 da tarde. Você está perguntando pro cara errado.
MARVEL: Tem tanta coisa acontecendo no Universo Marvel agora que traz grandes mudanças: Vingadores: A Queda, Dinastia M, Guerra Secreta, Illuminati, a origem de Wolverine, até mesmo as idéias conspiracionais que você apresentou no Homem-Aranha. É difícil manter todas essas bolas no ar? Como escritor, você está ciente do que os outros caras estão fazendo?
MARK: Tenho que ficar ciente até certo nível e inclusive ler gibis que não leria normalmente. Dito isso, Tom Brevoort é essencial para este projeto, porque sem ele eu estaria morto na página cinco. Tom sabe cada detalhe do passado, presente e futuro da Marvel e me guiou por todo o caminho, oferecendo conselhos sábios e sugestões brilhantes. Não se engane com sua semelhança com o Primo It. Esse cara tem um cérebro afiadíssimo e a Guerra Civil seria uma porcalhada completa sem ele. O escritório de Tom é ótimo. Audy, Aubrey e Molly foram excelentes.
MARVEL: Aparentemente, na primeira edição de Guerra Civil você consegue acabar com um dos alvos da ira do seu chefe. Joe Quesada sempre teve contas a acertar com o super-garoto Speedball. Você teve algum prazer em transformá-lo em baixa de guerra? Como Joe reagiu ao receber o roteiro? Muitas congratulações?
MARK: Joe uma vez me confessou que não sabe ler. Ele perdeu umas semanas de aula quando tinha seis anos e acabou ficando para trás, sem recuperar. Ele reconhece as letras e os logotipos das empresas, e se vira assim no mundo moderno. Ele não tinha entendido a proposta até que Steve fez as figurinhas e ele pegou a idéia básica vendo quadro a quadro.
MARVEL: Guerra Civil, naturalmente, acontece dentro das fronteiras dos EUA, mas há espaço na história para mostrar a reação de outros países quanto ao que está acontecendo aqui? Certamente as nações fronteiriças, como o Canadá, serão afetadas, mas veremos ramificações para a Europa, Ásia e outras partes do mundo?
MARK: Não muito. Os outros países são chatos, não acha? Se falam sobre alguma coisa que aconteceu fora dos EUA no noticiário, eu faço de conta que não vi, e faço o mesmo nos gibis. E digo isso como alguém que mora em outro país. Vamos falar do Canadá em algum ponto, mas é o mais exótico que vamos chegar. Tem muita coisa interessante acontecendo nos EUA para a gente perder tempo fora.
MARVEL: Compartilhe com os fãs um pouco da diversão que você teve criando os roteiros. Há rumores de que você fez três ou quatro roteiros, cortando, tirando e editando sem piedade os argumentos ou personagens que não funcionam pra você. Como foi isso? É o seu processo normal?
MARK: Não, é uma ocasião única para mim. Faço isso há um certo tempo e sei me virar com um roteiro. É incomum fazer um segundo roteiro para uma edição de Supremos, por exemplo, e um terceiro nunca aconteceu. Então imagine minha surpresa quando as duas primeiras edições de Guerra Civil passaram por algo tipo seis ou oito esboços, e continuavam pedindo mudanças. Geralmente, quando falamos de “esboços”, são algumas páginas, mas dessa vez foi preciso mudar seqüências e direcionamentos inteiros, mudar personagens de lugar. Introduzimos, por exemplo, um grupo chamado HAMMER que substituiria a SHIELD no registro de heróis e escrevemos duas edições com os caras antes de nos cortarem. É muito trabalho e não estou reclamando, porque uma série dessas precisa ser feita direito e com aprovação absoluta de toda a editora. Estou pegando personagens emprestados de outras pessoas e é óbvio que eles têm que estar satisfeitos com o jeito como vou devolvê-los. Tem sido uma grande colaboração, pois ouvi muita gente sobre o que fazer. É bem menos autonomia do que estou acostumado.
MARVEL: Capitão América e Homem de Ferro, dois “irmãos” que serviram juntos desde o início dos Vingadores (eles até compartilhavam a série Tales of Suspense nos anos 60) são os principais personagens da Guerra Civil. A pergunta “de que lado você está?” está relacionada diretamente à posição de cada um deles. Pode explicar por que escolher estes dois personagens como pontos de referência da Guerra Civil?
MARK: Foi uma evolução natural. Não lembro onde começou, mas os lados foram discutidos exaustivamente com os principais escritores e editores numa de nossas reuniões. O Capitão era óbvio, porque ele é o cara da liberdade, e o Homem de Ferro parecia o único cara com autoridade para discordar dele. Se esse fosse um debate ideológico entre Capitão América e Tigra, por exemplo, não acho que os leitores e o país ficariam tão divididos.
MARVEL: Que personagens surpreenderam você ao ganhar espaço na série; aqueles que talvez você não achasse que gostaria de escrevê-los, ou que não tinham muito a dizer, mas acabaram ganhando papéis mais importantes?
MARK: Esse seria o melhor jeito de fugir da pergunta, mas na verdade gostei de escrever todos eles. Foi um trabalho duro, mas o legal de fazer um cross-over gigante como esse é que você pode escolher entre dúzias de personagens clássicos para a próxima cena. É uma alegria total porque é impossível ficar entediado. Sempre que escrevo Reed ou Sue lembro de quanto gosto deles, mas o Capitão e Tony foram provavelmente os mais divertidos. O segredo é respeitar todos. É por isso que não vou matar todo mundo. O personagem mais imbecil, com a pior equipe criativa, uma origem terrível e que apareceu só um punhado de vezes é o personagem favorito de alguém. Alguém se vestiu como ele no Halloween, sabe? Você tem que ter isso em mente.
Fonte: Miolos.

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